segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Badalo

Todos o conhecem como Badalo. Ele reside no Centro Histórico e arredores, e é famoso na área. Não será difícil identificá-lo, comece pela roupa: normalmente é apenas um pano amarrado nos quadris. De vez em quando muda pra uma saia ou calça tamanho extra GG (quanto mais confortável, melhor). Caso o dia esteja mais frio, pode vir acompanhado de algum adereço na cabeça, um boné ou turbante. É um sujeito pacífico e alegre, gosta de cantar e dançar.

Ninguém sabe seu verdadeiro nome. O apelido foi dado porque ele tem um hábito curioso: gosta de andar nu. Quando você menos espera, ele pára no meio da rua, faz um discurso, tira a (pouca) roupa e fica pelado, pra quem quiser ver. Seria engraçado, se não fosse triste e chocante.

Um dos meus “encontros” com Badalo foi inesquecível. Foi numa manhã em que eu estava caminhando pela Rua Chile rumo ao trabalho. Estava distraída demais para prestar atenção ao que se passava ao meu redor, os pensamentos longe. Foi então que, de repente, algo me trouxe de volta à realidade: uma gritaria do outro lado da rua. Um bando de homens gargalhavam e gritavam para algo localizado à minha frente. Vi que se tratava de nosso amigo, nu em pêlo, vindo em minha direção. Numa questão de segundos fiz uma análise da cena: um ser humano nu, sem roupa, sem vergonha, sem pudor, sem limites, sem o que quer que fosse andando na rua enquanto um grupo de homens fazia chacota dele. Fiquei tão chocada com a reação do “público” - mais chocada talvez do que com a nudez propriamente dita - que nem percebi Badalo passar por mim.

Ele passou ao meu lado como se eu fosse invisível. Quase foi atropelado – imaginei que o motorista quisesse ver mais de perto aquela cena incomum. Apesar disso, não demonstrou qualquer sinal de perturbação, nem mesmo diante da algazarra que os homens estavam fazendo na rua. Algazarra esta, inclusive, que de tão grande me levou a achar que aqueles homens estavam profunda e sexualmente excitados com a explícita presença masculina de Badalo.

A situação toda me levou a refletir sobre algo. Aposto que nenhum daqueles homens reparou no físico fraco, na barba por fazer, na fisionomia de quem não está nem aí pra nada; ninguém pensou se aquele ser humano já tinha feito alguma refeição naquele dia, ou no motivo que o levou a agredir e chocar o mundo daquela forma. Os olhos deles foram direto no sexo. Como eu sei? Pelos comentários. As pessoas só comentam sobre a genitália. “É grande, é pequeno, só anda mole, como será que é duro...”. Fico imaginando um daqueles homens pensando “cara, o maluco tem o pau maior que o meu...”, porque é quase certo que algum deles - ou todos - pensou isso.

Também já presenciei reações femininas à Badalo. Entre gritinhos e risadinhas, as mulheres demonstram espanto, asco, medo. Saem correndo. Escondem os olhos com as mãos – mas deixam uma brechinha entre os dedos pra dar uma conferida no material. É como eu disse: o olho vai sempre lá. E comentam depois.


O sexo tem esse efeito hipnótico, magnético no ser humano, é instintivo. As pessoas olham e uma série de pensamentos ocorrem. Julgam. Criticam. Fantasiam. É o tabu que ao mesmo tempo em que intimida, atrai. Todos querem ver o cara que anda pelado pelas ruas do Centro Histórico. Afinal, não é todo dia que temos um pênis ambulante nas ruas de Salvador.

Nunca mais o vi. A última vez foi passando de carro pelo Comércio, há uns meses atrás. Ele usava o velho pano amarrado na cintura, como sempre, e sorria. Conversava consigo mesmo, talvez estivesse cantando sua música favorita. Espero que encontre um pouco do que perdeu – seja lá o que for - nas suas badalações pela cidade.

4 comentários:

Aline Barbosa disse...

A história do Badalo! =D

Gostei mto do seu texto... Essa coisa q vc disse, sobre o sexo, é bem verdade... Enfim... Ótimo texto.

Bjo!
\o7

Camila Melo disse...

Amei o texto!!Muito bom!

Próxima vez que ver Badalo,relata aqui viu?xDDD

beeejo
=]

Rômulo disse...

A história de badalo, muito bom nanda.
e como diz aline, nanda tu escreve muito bem, continua assim o/

André disse...

Badalo virou ícone!!!